Por Paulo Pellegrini –
jornalista e músico
Na
década de 80, era possível ouvir pop-rock em São Luís nas festas animadas por
grandes bandas de baile, como O Peso
e Os Fantoches, que, no meio do
vasto repertório de inúmeros estilos musicais, sempre tocavam músicas de
novela, sucessos internacionais e um ou outro rock nacional.
Pelo
menos uma banda despontou até a primeira metade da década: a Morcego Vermelho, que viraria a Pirâmide, cuja canção autoral “Política” ficou no imaginário de muitos
roqueiros. A banda tinha entre os integrantes Maurício Éverton, que montaria depois o Estúdio e Produtora Metanóia, no Edifício Caiçara; e Gil
Estrela.
Alexander de Carvalho (Daphne) e Maurício Éverton (Morcego Vermelho\Pirâmide), em 1996 |
Carlos Pança e Pedro
Cordeiro lembram também das bandas Camisa
de Força e Filhos da Revolução.
Pança: “Camisa de Força... talvez a primeira banda de pop-rock que emplacou
duas músicas que rodaram intensamente nas rádios FM maranhenses durante pelo
menos uns dois meses – incluindo aqui a famigerada Cidade FM. Uma dessas
músicas era a famosa “Cabaço”, que, por sinal, era uma letra de Joacy James que
os caras viram e adotaram. (...) Nela tocaram caras como Maurício Alicate, que
logo depois, junto com Eduardo (que era o batera da banda) participou da
primeira formação da banda Fome”.
Pedro Cordeiro: “Nessa vertente havia também Camisa de Força e
Filhos da Revolução (que só vi uma vez). Também Cabelo de Alma”.
O
antológico show de Lobão e dos Titãs no Ginásio Champagnat, no Colégio
Marista, em 1986, aglutinou milhares
de roqueiros (fala-se em 8 mil pessoas!) e serviu como inspiração para que o
palco abrigasse pelo menos uma apresentação dos Aranhas Boys, uma banda satírica de professores, liderada pelo
professor Lobão, de Biologia, futuro sócio do cursinho Aprovação.
O
Marista também foi a origem da Digital 4, cujo momento glorioso foi o
show no Terreiro da Cidade (local que
abrigava nas décadas anteriores um estádio de futebol e que hoje é a Igreja
Universal do Reino de Deus, no Diamante), em que Jayr Torres levantou o público com o solo clássico de Sultans of Swing, sob o olhar
embevecido do vocalista Glaydson Penha,
o atual cantor Glad.
Glad relembra:
“O
rock no Maranhão nos anos 80! Me orgulho de fazer parte dessa história com a
banda Digital 4 com primeira formação: Eu, Leandro Brunno (Leandro Silveira),
Ibrahim Assub Júnior e Alex Carneiro. Segunda formação: eu, Jayr Torres,
Marcelo (baterista) e Alex Carneiro”.
Banda Digital 4 - Glad, Alex Carneiro, Leandro Silveira,
Ibrahim Assub (1988)
|
Em
1988, Alexander de Carvalho e os
irmãos Paulo e Cesar Pellegrini fundaram a Pop
Brasil, que logo mudou de nome para Daphne.
O primeiro show da Daphne foi na Boate Apocalipse do Hotel Vila Rica, em 1990.
Também
em 1990, Adriano Corrêa (guitarra) e Eldro
César (bateria) fundaram a Alcmena.
Podemos atribuir à Alcmena o mérito
de abrir os bares de São Luís para shows regulares de pop-rock. A banda fez
temporadas marcantes no La Rotisserie
(Av. Castelo Branco) e no segundo piso do Monumental
Shopping, sempre para grandes públicos.
Em
1991, quatro irmãos de São José de Ribamar procuraram a Daphne para organizar shows de
projetos. Era a Paul Time, cujo nome
homenageava Paulo, um quinto irmão
da família precocemente falecido. Outras bandas de pop-rock que despontavam à
época eram a Face Oculta, a Estado Nítido (do vocalista Valério Valente),
a Palavra de Ordem e a Legião Cover.
A
Legião Cover é a única das bandas de
pop-rock do início dos anos 90 que sempre esteve em atividade até os dias
atuais. Naquele período, a formação mais conhecida era Zuilton Guimarães (voz), Benone
Carvalho (baixo), Jean Charles
(guitarra) e Aziz (bateria).
A
Palavra de Ordem tinha como
vocalista o estudante de Comunicação Cassiano
Viana, além de Ronaldo
(guitarra) e Carlão (bateria). O
tecladista da Daphne Paulo Pellegrini
participou da banda por alguns meses em 1992.
Nunca
é demais lembrar das três edições do São
Luís Rock Show, em 1990, 1991 e 1992, produzidas por Jorge
Capadócia, possivelmente até hoje o maior evento de rock, para bandas
locais, já feito na capital maranhense. Somando as três oportunidades, mais de
30 bandas participaram, de todos os tipos e vertentes.
Entre
as atrações, um cantor e compositor que costumava se apresentar na Galeria Éden, na Rua do Egito, alternando canções da MPB com um repertório autoral
que já se mostrava interessante. No São
Luís Rock Festival, o artista “provocou” o público: “vocês querem ouvir uma lambada?”.
Atônitos,
os espectadores ficaram apreensivos. E o cantor começou realmente uma lambada,
mas que durou cerca de dez segundos, encerrada por um definitivo “Acabou!”.
Seu
nome? Zeca Baleiro.
Filhos da Revolução, Whydia, Daphne,
Ácido, Fome, Lúgubre, Ânsia de Vômito, Amnésia, Nirvana (totalmente por acaso homônima da de Seattle), Ruminando Cogumelos, Loucura Elétrica...
Algumas das bandas que tocaram nas diversas edições do São Luís Rock Show.
Sino César, um dos fundadores da Loucura Elétrica, lembra:
“E
a Ruminando Cogumelos, de Athos? No primeiro São Luís Rock Show, eles e nós
fomos escolhidos ‘bandas revelação’. Cabe uma curiosidade aí: nós (Loucura)
tocamos no último dia, e a ‘banda revelação’ já tinha sido escolhida
(Ruminando). Depois que terminamos o show, Jorge deu o anúncio que seriam duas
‘bandas revelação’: a Ruminando Cogumelos e Loucura Elétrica. Tanto que tocamos
de novo no final do festival, depois da Ruminando”.
Sobre
a Loucura Elétrica, do vocalista Fernando e do tecladista Jean Feres, especialista em sons
progressivos ao estilo Led Zeppelin e Deep Purple.
Sino César revela:
“...A
formação original da Loucura Elétrica: eu (que batizei a banda), Avilásio Maranhão,
Márcio Major, Ricardo Gordo e Ricardo Braga. Depois vieram Fernando, Jean,
Tico, entre outros”.
Por
volta de 1992, o guitarrista da banda O
Peso, Pepê Júnior, lançou um LP
solo, que, apesar de algumas misturas, pode ser enquadrado como um disco de
pop-rock, na pegada Lulu Santos e Pepeu Gomes. Uma das faixas,
“Fofocadinho”, era uma provocação ao guitarrista Edinho Bastos.
Apesar
de ser uma banda de hard-rock, a Whydia
mantinha uma proximidade com os grupos de pop-rock. Os ensaios da Whydia e da Daphne aconteciam em casas vizinhas e sempre era possível ver as
duas bandas realizando jam sessions.
Diversos
músicos tocaram na Whydia, além do vocalista Elvis: Cutrim Stones, Maurício, Nelsinho,
Carlão, Jorginho Ribeiro e Tony Ilha, este já falecido.
Em
termos de gravações, é possível lembrar dos promos “Acreditar”, da Daphne, e
“Vice-Versa”, da Estado Nítido, gravados em 1991 e que tocaram na Rádio Mirante FM por algum tempo.
Entre
1994 e 1996, a Daphne gravou no
Estúdio Sonato as faixas que
comporiam o CD “Semblantes”, o
primeiro CD de rock do Maranhão. Em 1997,
a Paul Time lançaria seu primeiro
CD, de título homônimo. A faixa “Palavras
Erradas” virou vídeo-clip que chegou a ser exibido na MTV Brasil.
Ingresso do show de lançamento do CD Semblantes, o primeiro CD de uma banda de rock maranhense, em 29081996, no Teatro Arthur Azevedo |
1996 registrou um grande evento no Ginásio
Costa Rodrigues, promovido pela Rádio
Mirante FM: o Ilha Rock Festival.
Diferentemente
do que acontece hoje, em que as bandas estão praticamente confinadas a poucos
espaços da Praia Grande e da Lagoa da Jansen, o pop-rock maranhense
dos anos 90 circulava por diversos bairros de São Luís. Era comum ter eventos no Clubão da Cohab, nas Associações
dos Moradores do Cohatrac e do Maiobão,
em festivais na Praia do Calhau, no Centro de Convenções da UEMA e nas boates Gênesis e Tucanu’s.
Já
o bairro do São Francisco possuía
pelo menos três espaços marcantes de shows. O mais famoso foi o Clube do Bento, mais apropriado para o
rock pesado, mas também houve shows importantes, de várias vertentes do rock,
no Equator (Av, Ana Jansen) e no
andar de cima da loja Maison Suisse, atual Extrafarma, em frente ao Hiper Bom Preço da Avenida Colares Moreira. O restaurante Peixe na Telha, na Ponta do
Farol, foi mais um local que abrigou diversos shows de rock na década de
90.
Mais
duas bandas dos anos 90 merecem ser lembradas: a Maska Potó, de Paulo Renato, Alexandre ‘Repolho’, Marfilho, Lúzio e
Marcelo Rebelo. O grupo retornou às atividades com outra formação e outro nome,
Zappen, mantendo o vocalista, Paulo Renato.
Agradecendo
aos comentários e acréscimos, reitero que esse texto foi feito totalmente
baseado em memórias pessoais, que são, certamente, bem falhas.
Tanto
que eu mesmo vou acrescentar uma banda importante que está faltando, que me
veio à mente um dia desses: Los Boddah.
Um
projeto capitaneado por Kit Cavalcante
(Kit Boddah), que começou fazendo covers do Nirvana, por volta de 1992
e depois investiu em autorais também. Hoje,
Kit tem um projeto de reggae, o Juba de
Leão, além de ter sido uma figura importante como promotor de discos, em
lojas especializadas.
Segundo ciclo
Simbolicamente,
a morte de Renato Russo e o advento
de bandas como Chico Science e Nação Zumbi e O Rappa trouxeram como efeito para o pop-rock de São Luís o
surgimento de bandas com som mais híbrido. Passou a ser comum que os eventos de
rock abrigassem bandas de reggae, mangue
beat, hip-hop e fusões em geral.
Uma
banda que simbolizava bem essa época foi a Com
Fusão Pop, apadrinhada pelo radialista Gilberto
Mineiro, que infelizmente durou pouco tempo.
Esse
espírito motivou produtores e jornalistas culturais como Eduardo Júlio e Alex Palhano
a desafiarem bandas para criar versões diferentes de músicas da MPB no Festival do Canto do Tonico, na Praia Grande, em 1999. Entre
as bandas concorrentes, estavam a Samsara,
que venceu, a Areias e a T.A. Calibre 1.
Todas
essas bandas fizeram despontar músicos que fariam carreiras importantes nos
anos seguintes, como Ramúsyo Brasil,
Costelo, Ana Areias, Miguel Ahid, Bruno
Barata e Eduardo Patrício.
O
bar Porto Livre, do empresário Lula Fylho, foi um espaço aglutinador
de bandas e DJ’s entre 1997 e 1999, e testemunhou o surgimento da General Purpose, cuja célula básica (o
baterista Franklin Nazarus, o
guitarrista Érico Monk e o baixista Jorge Ribeiro) se transformaria tempos
depois na Nimbus Paradisia, sob os
vocais de Erin Cy. Outra banda que
apareceu no final dos anos 90 foi a Guinevere.
Com
um som mais próximo da MPB, podemos destacar os projetos Mandorová, de Ramúsyo, e
Boca de Lobo, de Assis Medeiros, Ana Areias e Hamilton Oliveira.
Mas
o grande fenômeno do início dos anos 2000 foi o trio Catarina Mina, cujo nome original era Mr. Claus. O projeto teve como embrião os festivais de música
popular promovidos pelo bar Zanzibar,
na Litorânea, quando as canções de
compositores como Djalma Lúcio e Fábio Abreu começaram a ser conhecidas.
A
Catarina Mina em si acabou se
restringindo a Djalma (voz e
violão), Bruno Azevedo (baixo) e Eduardo Patrício (bateria) e arrebatou
fãs por toda a cidade, apostando em um som autoral e releituras que iam de Valdick Soriano a The Smiths.
O
EP de quatro músicas da Catarina Mina, de 2002, transformou em sucesso as canções “Traduzindo” e “Haicai”.
Neste mesmo período, saiu o segundo CD da Paul
Time, chamado “Espermatozóide”
e, um ano antes, o segundo da Daphne,
“Por que não?”.
Mais informações e\ou correções, comente!
Leia:
Introdução - A tarefa é árdua, hercúlea, mas pode resultar em uma boa diversão!
Parte 1 - Histórico dos Anos 80
Parte 2 - Punk Rock e Hard Core
Parte 3 - Os primeiros festivais escolares e shows
Parte 4 - O death metal, o grindcore e as blasfêmias primordiais no Maranhão
Parte 5 - Lembranças do pop-rock de São Luís do final dos anos 80 ao começo dos anos 2000
Leia:
Introdução - A tarefa é árdua, hercúlea, mas pode resultar em uma boa diversão!
Parte 1 - Histórico dos Anos 80
Parte 2 - Punk Rock e Hard Core
Parte 3 - Os primeiros festivais escolares e shows
Parte 4 - O death metal, o grindcore e as blasfêmias primordiais no Maranhão
Parte 5 - Lembranças do pop-rock de São Luís do final dos anos 80 ao começo dos anos 2000
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